quinta-feira, 11 de abril de 2013

Caminhar pelo glaciar da Patagónia – Argentina



Se sente atracção pelas paisagens vastas e cobertas de neve dos Pólos mas preferia não dar de caras com gelo flutuante ou com um urso polar, o “campo de hielo sur” (camada de gelo do sul) da Argentina, também conhecido como o terceiro pólo, constitui uma alternativa. Aqui, o que se pisa é gelo que atravessou eras, com mais de mil metros de espessura. Fazer uma caminhada através deste lugar é como visitar o mundo de há 10 mil anos, durante a última idade do gelo.
Com mais de 350 km de comprimento, este glaciar é a maior porção de gelo não polar do planeta, a terceira maior massa glaciar depois da Antártida e da Groenlândia. Chegar até ele é uma aventura em si mesma, através do Parque Nacional Los Glaciares, na Patagónia. Caminhando por florestas virgens e passando por quedas de água e riachos alimentados pelo lento degelo, chega-se por fim ao que parece ser um interminável mar de gelo.
A Patagónia estende-se por dois países – Argentina e Chile – e cobre uma área de quase 800 mil km². A paisagem é dominada pelas montanhas glaciares, vales dramaticamente pronunciados e também planícies vastas. No lado chileno, tem início a sul da cidade de Puerto Montt e na Argentina, a sul do Rio Colorado. Separando os dois países e elevando-se bem acima das estepes, encontra-se a majestosa cordilheira dos Andes. É dai que descem os gigantescos glaciares que alimentam de água os distintos lagos verde-azuis da região. A Patagónia termina na Tierra del Fuego, literalmente o “fim do mundo”, o extremo mais a sul do continente americano.
A buliçosa cidade de El Calafate é uma porta de entrada para as populares atividades de aventura no sul da Patagónia e um ponto de partida para caminhadas pelo glaciar. A partir daqui são cinco horas de viagem por uma estrada difícil que termina na localidade de El Chaltén, junto ao parque nacional Los Glaciares. Continuando através das planícies abertas, os únicos sinais de vida são os guanacos (similares aos lamas), quintas remotas e um ou outro gaúcho a cavalo.
Outrora um simples e remoto ponto e passagem de fronteira com escassos edifícios, El Chaltén tornou-se a base de inúmeras expedições aos picos circundantes do maciço Fitz Roy, onde monólitos graníticos de 1500 metros de altura assentam como torres de vigia. A rua principal é ainda de terra batida, onde os cavalos e viajantes vagueiam livremente e o vento chicoteia e levanta o pó em espiral, mas existem já equipamentos modernos, incluindo pequenos hotéis, restaurantes e algumas lojas, o que faz com este seja um local de base confortável.
O início do trilho situa-se a cerca de 20 minutos de carro a partir da cidade. Então, uma pequena tabuleta aponta para um rio serpenteante que segue em direção a uma floresta de faias e ao local de acampamento de Piedra del Fraile. Neste ponto, a vista panorâmica mostra todo o vale circundante, os picos cobertos de neve, bem como o caminho que sobe em direcção ao gelo. Uma suave caminhada de duas horas leva-o até ao acampamento. Um objetivo fácil para o primeiro dia e para fazer uma paragem para almoço.
A partir daqui, a paisagem torna-se mais vasta, ao longo do rio alimentado pelo Lago Elétrica e o terreno vai ficando cada vez mais difícil à medida que o caminho se aproxima do vale glaciar, tenha atenção aos condores andinos que vão pairando, pois o seu voo é uma boa distração que ajuda a esquecer a dificuldades do caminho.
Tudo isto poderá parecer muito estranho se pensar que está rodeado de enormes montanhas e se está a dirigir para uma praia (La playita). Mas este primeiro local para pernoitar apenas tem essa denominação por ser uma arenosa margem do rio. Uma cama macia para um sono bem merecido.
A jornada que se segue até ao gelo começa logo no dia seguinte, enquanto se põem os ganchos pela primeira vez e se começa a trepar ao glaciar Marconi. À distância, aparece apenas um gelado soprado pelo vento, mas de perto toda a suavidade desaparece. Agora, parece um enorme labirinto gelado no qual se tem que escolher o caminho para transpor obstáculos como pontes esculpidas no gelo ou buracos cavernosos tão profundos que um pé mal colocado pode significar ser-se engolido.
Como geladas madeixas de cabelo, o glaciar estende-se em cascata. À medida que estas tranças começam a ser transpostas o glaciar vai virando gradualmente à direita, revelando uma vista que parecia perdida há dois dias: o gelo conduz abruptamente até ao que parece ser uma autêntica muralha intransponível, com grandes porções de neve como que penduradas no topo, à espera de cair. À nossa frente está o Paso Marconi (Passagem Marconi), a porta de entrada para o glaciar.
O caminho e forma de transpor este obstáculo têm que ser escolhidos cuidadosamente, mas também com rapidez. A perícia do guia é inestimável no que diz respeito à segurança desta operação, devido aos pedaços de neve que podem cair a qualquer momento e provocar uma avalanche. Lá em cima, no entanto, o terreno é mais suave e muito menos exigente em termos físicos do que parece, à distância, e apesar de ligados por uma corda ao nossa guia, não se exige, nesta parte, grande conhecimento de alpinismo. Apesar disso, um machado apropriado para o gelo é absolutamente necessário para conseguir parar em caso de um deslize. Com alguma concentração esta área é facilmente transposta e a parte mais difícil fica concluída.
Uma vez ultrapassada e passagem, um curto trilho leva-o até ao vasto cobertor de branco em que a panorâmica do glaciar é verdadeiramente impressionante. Apesar de todo o caminho até aqui ser de extraordinária beleza, nada o prepara para a sublime e alva paisagem que deixa qualquer um de boca aberta.

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